A população Negra no Brasil enfrenta grandes dificuldades de exercitar a sua cidadania. Temos os piores indicadores de desenvolvimento humano, como acesso à educação, saúde, trabalho digno, entre outros. Somos mais vítimas de mortes violentas, tanto perpetrada por civis quanto pelo braço armado do Estado, além daquelas relacionadas às acidentárias como as de trânsito. Os mais de 130 anos de fim do sistema escravista não foram suficientes para mudança radical de milhões de negras e negros na sociedade brasileira.

Os obstáculos continuam presentes apesar de algumas mudanças acontecidas nestes últimos vinte anos. As últimas duas décadas testemunharam a introdução definitiva da agenda antirracista no Brasil. Fruto da ação do Movimento Social formado por mulheres e homens negros, conseguimos algumas conquistas legais que impactaram na atual realidade que temos hoje. A Lei nº 10.639/2003, que torna obrigatório o ensino da África e da cultura Afrobrasileira nas escolas, o Estatuto da Igualdade Racial, em que o Estado reconheceu a existência das assimetrias entre negros e brancos causadas pelo racismo, e as leis de cotas para o ensino superior e para cargos públicos por concurso são exemplos de avanços.

Porém, muito há de ser feito para que haja por parte da população negra acesso a uma sociedade de bem-estar, onde ela possa viver com dignidade, conquistando os seus objetivos com o suor de seu rosto, tendo o direito de ir e vir assegurado, sem o receio de coação por parte de agentes públicos e/ou privados. Imbuídos (as) do sentimento de pertencimento, de solidariedade e de desejo de mudanças que mulheres e homens negros reúnem-se para a criação da Rede de Articulação pela Geração da Renda Preta - REAGE, visando contribuir para o fortalecimento da população negra nas áreas de negócios, educação, política e justiça social. Nossa inspiração são entidades como a Frente Negra Brasileira que, entre as décadas de 1920 e 1930, se empenhou para levar a educação ao povo preto, quando o Estado se omitia. Também somos inspirados pelo Teatro Experimental do Negro, liderados por Lélia Garcia, Ruth de Souza, Alberto Guerreiro Ramos e Abdias Nascimento. O TEN lutou pela igualdade racial, propôs na Assembleia Constituinte de 1945 a criminalização do racismo e defendeu a tese de protagonismo do povo negro a partir da valorização de sua herança religiosa, estética e cultural. Nossa inspiração é o Movimento Negro Unificado contra a discriminação Racial que tantas figuras pretas ajudou a formar e a lutar pela igualdade e contra o racismo no Brasil.

Certamente, o MNUDR na figura de Lélia Gonzalez, Helena Theodoro, Edson Santos e tantas outras pessoas pretas espalhadas nesse Brasil nos inspiram para a constituição dessa Rede de Articulação pela Geração da Renda Preta - REAGE. Somos um grupo organizado pelo propósito de contribuir pela valorização e fortalecimento do povo negro no Brasil, pela certeza que o país será melhor se todas as pessoas tenham dignidade. Temos origens familiares, profissões e históricos distintos. Mas todas (os) nós, em nossa história, enfrentamos o racismo como instrumento dissuasório de nossos projetos. Tivemos que ser resilientes, pacientes, competentes, persistentes e contar com a solidariedade em maior ou menor grau de pessoas que não vissem em nosso corpo um limitador para os nossos anseios e projetos. Queremos, portanto, combater o racismo por meio da formação, parceria e articulação com outros atores sociais, políticos e econômicos de modo que mais pessoas negras possam fortalecer o sentimento de ubuntu, construindo uma solidariedade fundada na ancestralidade e mirando para um futuro com oportunidades de acesso à educação, ao trabalho digno e à riqueza. Queremos incorporar definitivamente os nossos irmãos e irmãs na sociedade e na economia, não apenas como meros consumidores, mas sim protagonistas de trajetórias de sucesso profissional, empresarial e financeiro

Queremos inspirar nossos companheiros de cor a aspirarem o mais alto, rompendo com a lógica de gueto de uma sociedade historicamente racista. Queremos, assim, exercer a cidadania plena, ocupando os espaços políticos, sociais e econômicos nos diversos níveis; participando de modo igualitário das decisões em nossas cidades, estados e nação.